Por Roberto Bozzetti*
Meu encontro com Pellon foi no ensino médio, em 1972 na Escola Técnica Federal Celso Suckow da Fonseca, no Maracanã, atualmente Cefet, que aliás, tem hoje uma garotada boa brigando contra um esbirro desse pulha desse ministro da deseducação. Nossa amizade não se desfez nem arrefeceu durante muito tempo, continuamente, ao longo de toda a década de 70 e também a de 80, quando a vida acabou nos afastando.
Nossas parcerias, acho, que resultaram em cinco canções, se não erro a conta, sendo um partido-alto do musical infantil, um tango, e mais três sambas (ou quatro?), que são uma linha bem diferente do trabalho usual do Pellon, não sei como funcionam, não tenho muita nitidez como elas se comportam em contraponto ao conjunto do que ele compõe.
São talvez menos originais do que as que ele compôs sozinho ou com Paulinho Lêmos, porque eu sou apenas letrista, que é onde o Pellon é realmente original já que melodicamente ele é muito bom, mas é puro pastiche — no melhor sentido do termo, por mais que este pareça pejorativo — e as letras que escrevi creio que não têm a força das letras dele. Mas estão aí, não sou eu quem devo falar muito delas não.
Há algumas parcerias minhas com Calaça, também, que eu gostaria de ver recuperadas, como uma valsinha ligeira em que na letra eu dava a receita de como se preparar uma criança na panela e degustá-la. Além, por óbvio, das canções do filme que a Fatima Lannes roteirizou e dirigiu, cuja trama é toda costurada por canções de Pellon.
Tudo isso era fruto de aprendizado nosso, da carpintaria por assim dizer, de como juntar acordes, sílabas, um aprendizado da artesania da fatura das canções. Mas diga-se uma coisa a bem da verdade: esse lado da carpintaria não ensinou quase nada ao Pellon, que já se juntou a nós feito, pronto, com seu caminho peculiar já traçado, de sambista na tradição de quem não toca instrumento algum (como Zé Keti, Vanzolini, Adoniran) e com uma visão peculiaríssima do mundo e da arte.
Se a Malta (Coletivo Malta D’Areia) foi estimulante para ele — que já era o autor da imensa maioria das canções que está gravando hoje — o foi em termos de discussões, de convívio, creio. Ah, sim, talvez que as parcerias com Paulinho Lêmos, pela formação de músico de Paulinho, tenham traçado a ele um pouco desse aprendizado. Na verdade, me parece ter sido um aprendizado para ambos.
Sobre Roberto Bozzetti
Roberto Bozzetti é parceiro de Fernando Pellon desde o tempo do Coletivo Malta D’Areia. É professor de Teoria da Literatura na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, onde trabalha preferencialmente nas áreas de poesia literária e poética da canção.
Compositor, além da parceria com Fernando Pellon, ele tem canções em parceria com Fred Martins — excepcional compositor niteroiense atualmente radicado em Portugal (como Paulinho Lêmos). Algumas delas foram gravadas, também, com Eduardo Aguiar e com meu filho mais velho, Nino Navarro.
Bozzetti tem três livros de poesia lançados, o último deles em 2017, “Despreparação para a morte”, pela Editora Texto Território.